março 01, 2020

Doenças raras: descoberta em Serrinha dos Pintos, Síndrome de Spoan reúne maior agrupamento de pessoas afetadas no RN

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Paula e Elenara em Serrinha dos Pintos — Foto: Arquivo pessoal/Cedida

Paula Dayana Moura Queiroz, a Paulinha, de 25 anos é uma das 15 pessoas portadoras da rara Síndrome de Spoan em Serrinha dos Pintos, cidade distante 385 quilômetros de Natal e considerada a capital mundial da doença. Paulinha é a segunda filha do casamento entre José Moura Sobrinho e Elenara Maria de Queiroz Moura, dois primos de primeiro grau.

De acordo com Silvana Santos, bióloga paulista responsável pela descoberta da doença e atual professora da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), o Alto Oeste do Rio Grande do Norte concentra o maior agrupamento (cluster) de pessoas afetadas com a doença (73). Com 40 casos, São Miguel, que fica a 83 quilômetros de Serrinha dos Pintos, é a cidade do RN com o maior número de portadores. Os pesquisadores identificaram ainda casos de Spoan no Rio Grande do Sul (2), Minas Gerais (1), São Paulo (6) e no Egito (2).

A rara síndrome demorou uma década para ser diagnosticada em Paula, que viveu até os 10 anos de idade com uma doença até então considerada misteriosa. Os olhos “tremidos” e a dificuldade para caminhar - característicos dos portadores de Spoan - chamaram a atenção de Elenara durante a infância da filha.

Essa é a segunda matéria da série de reportagens Doenças Raras no RN do G1. O último conteúdo será publicado na segunda-feira (2). As matérias marcam o Dia Mundial das Doenças Raras, celebrado em 29 de fevereiro - data também rara, que só aparece no calendário a cada quatro anos.

“Eu desconfiava porque já tinha alguns casos de pessoas que nasceram com deficiência na família. Eu já tinha tido uma filha que nasceu saudável, então sabia que era estranho Paulinha não conseguir nem sentar direito com sete meses de vida. Fui em fisioterapeuta, neurologista e pediatra em outras cidades, mas ninguém sabia o que era ao certo. Descobri mesmo em 2004 quando o pessoal da USP já estava por aqui em Serrinha estudando a Spoan”, conta Elenara.

Nos primeiros meses de vida, Paulinha ainda não havia manifestado todos os sintomas da Spoan, uma vez que a doença evolui de forma mais agressiva na transição da infância para adolescência. “Com 4 anos, ela ainda caminhava, mas com muita dificuldade. Depois os braços foram enrijecendo. Hoje Paulinha toma remédios, é cadeirante e totalmente dependente de mim, dedico minha vida a cuidar dela”, diz Elenara.

Paulinha já caminhava com dificuldades aos 4 anos — Foto: Arquivo pessoal/Cedida

"É difícil, saber que tenho uma rotina dupla porque preciso ajudá-la nas suas tarefas, da sua higiene a sua alimentação, já que ela não consegue mais executá-las por causa das limitações que o corpo dela vem sofrendo. Mas tudo vale a pena, conviver com Paulinha é compartilhar de um amor sem limites"

A Spoan é uma patologia rara neurodegenerativa que causa efeitos nos movimentos das pernas e dos braços, além de afetar a fala e a visão. A mutação genética é provocada pela união consanguínea e foi descoberta por pesquisadores do Centro de Estudos do Genoma Humano e do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP) em 2001, na pequena Serrinha dos Pintos. Na cidade de 4.800 habitantes, ir ao altar com alguém da mesma família se tornou um costume local.

“Uma pessoa chegou na USP, com quadro neurológico grave, alteração visual, perda de memória, andando de forma estranha, perda de força e isso não batia com nenhum diagnóstico reconhecido. O neurologista que acompanhou esse paciente perguntou se ele conhecia algum outro caso parecido e o homem disse ‘lá na minha terra no RN, só o que tem é gente como eu’. O pessoal da USP foi a Serrinha dos Pintos e daí saiu o primeiro diagnóstico”, explica o médico geneticista João Neri.

Fonte: G1/RN